Na era da economia de baixo carbono, Brasil já tem 552 startups ambientais

Publicado dia 26/12/2019

Empreendedores atuam nos setores de gestão da água e de resíduos, agropecuária, energia, entre outros

Giovana Girardi – O Estado de S.Paulo, 22/12/2019

Nos corredores da Feria de Madrid, onde foi realizada a Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (ONU) nas duas primeiras semanas do mês, enquanto diplomatas discutiam, sem muito sucesso, como avançar no combate ao aquecimento global, um grupo brasileiro mostrava que negócios inovadores estão avançando rapidamente. São as chamadas clean techs – startups que fazem negócios bons para o clima e trazem soluções com o objetivo nada modesto de tentar salvar o planeta.

Esse movimento vem crescendo no País e no mundo. Entre 2018 e 2019, somente o Instituto Climate Ventures, que ajuda a estruturar startups com esse propósito, mapeou 552 negócios no Brasil que rendem impacto positivo no clima, promovendo o que eles chamam de economia regenerativa e de baixo carbono. Espalhados por todas as regiões do País, atuam nos setores de gestão da água e de resíduos, agropecuária, energia, logística e mobilidade, e uso do solo e florestas.

Em novembro, na Climate LaunchPad, competição internacional de clean techs que ocorreu em Amsterdã, o Brasil foi o país com o segundo maior número de negócios inscritos – 155 –, perdendo só para a Índia, com quase 500. No total, participaram do evento 2.601 empreendedores de 53 países.

E em junho, a feira Conexão Carbono Zero, voltada para soluções que visem transformar os modelos de negócios e políticos para reverter a mudança climática, concluiu que trabalhar a favor do clima traz oportunidades que somam US$ 42 bilhões. As empresas participantes do evento revelaram que já investiram US$ 5 bilhões em soluções desse tipo e evitaram a emissão de 921 milhões de toneladas de carbono.

Outro projeto vencedor da chamada deste ano de Bons Negócios pelo Clima da Climate Ventures foi o Macaúba, da startup Inocas, de Minas Gerais, que tem como objetivo gerar uma alternativa ao óleo de palma a partir da palmeira típica do Cerrado brasileiro.

“Hoje, 60% de tudo o que existe em um supermercado têm óleo de palma – do chocolate ao hidratante de corpo. Mas o plantio da palma levou ao desmatamento de grandes áreas de floresta tropical no mundo, em especial na Indonésia. Defendemos a macaúba como uma alternativa sustentável à palma”, explica Johannes Zimpel, diretor executivo da Inocas.

A ideia surgiu de uma provocação feita pela companhia aérea Lufthansa, que queria uma alternativa aos combustíveis fósseis para abastecer seus aviões. A macaúba surgiu como uma opção para isso. Hoje ela ainda não chegou ao estágio de substituir o diesel, mas a Inocas desenvolveu uma metodologia de extração otimizada do óleo, que mostrou ter as mesmas qualidades da palma.

O plantio vem sendo feito em áreas de pastagem degradada, aumentando a produtividade do gado e criando renda extra do óleo. “O Cerrado tem 50 milhões hectares de pastagens. Se o conceito fosse replicado em todas, seria possível não só melhorar a renda no pasto como ter uma produção de macaúba que atingiria o dobro da produção mundial de palma”, diz Zimpel.

Outro exemplo de destaque é a Stattus4, de Sorocaba, que desenvolveu, com inteligência artificial e internet das coisas, uma forma de “escutar” os encanamentos das cidades a fim de conter perdas de água no sistema.

“Hoje o Brasil perde cerca de 38% da água coletada nos mananciais durante a distribuição. Se reduzíssemos 20% disso, já seria possível abastecer os 35 milhões de brasileiros que não têm acesso à água potável”, calcula Marília Lara, sócia da empresa.

O sistema de sensores desenvolvido por sua equipe melhora um trabalho que hoje depende de profissionais, os geofonistas, que vasculham a cidade escutando ruídos em hidrômetros. Com esses equipamentos outras pessoas, que não são especialistas, podem fazer uma primeira varredura, bem mais rápida, nos hidrômetros e depois, somente nos casos suspeitos, vai o especialista. “Em vez de ter de passar em todos os locais, ele vai a 2% só, melhorando o sistema”, explica.

A Stattus4 já atua em 32 cidades, onde vivem mais de 8 milhões de habitantes.

Matéria original: Giovana Girardi – O Estado de S.Paulo |