Publicado dia 11/11/2016
A tese defendida em abril de 2016 teve como principal questão responder “Por que a avaliação do ciclo de vida dos produtos é pouco difundida no Brasil ?”
Foi levado em consideração que a metodologia de avaliação do ciclo de vida e as oportunidades de geração de ecoinovações decorrentes, podem contribuir de forma significativa para a redução dos impactos ambientais resultantes das atividades do setor produtivo brasileiro. Buscou-se desta forma, identificar as barreiras e oportunidades para a adoção da abordagem do ciclo de vida do produto no Brasil, tendo em vista as possibilidades de geração de ecoinovações daí decorrentes.
No Brasil, a ACV ainda não está estabelecida, de forma abrangente, como uma metodologia de auxílio à tomada de decisão no setor industrial. Assim, cabe indagar em que medida isso se deve à falta de informações sobre os eventuais benefícios, ou à falta de uma política pública, ou ainda ao fato de, no Brasil, os recursos naturais não serem tão escassos como nos países mais industrializados.
O desenvolvimento efetivo da ACV remete também à necessidade da implementação da abordagem do pensamento do ciclo de vida nas organizações brasileiras, mesmo que inicialmente não sejam para a execução de uma metodologia mais complexa como a própria ACV. Mas ao ser implementada a abordagem do ciclo de vida nas organizações, as mesmas serão capazes de realizar um estudo abordando o ciclo de vida e poderão pensar seus processos a partir dessa abordagem.
No entanto, a ACV traz ainda dúvidas quanto a seu uso, implementação e interpretação. Desta forma, analisar as experiências de outros países e as dificuldades práticas que o Brasil enfrenta para implementá-la em larga escala na indústria nacional, torna-se um passo importante para a compreensão de seu processo. Esta compreensão poderá contribuir para a difusão dessa ferramenta no Brasil e, consequentemente, para a geração de ecoinovações.
A relevância desta tese pode ser discutida frente ao desafio claro que a indústria brasileira tem em inovar atendendo às questões ecológicas.
A pesquisa foi composta de uma revisão bibliográfica que buscou fornecer o estado da arte sobre os temas abordados e de uma pesquisa de campo. A pesquisa de campo teve escopos distintos pautados no questionário internacional e nacional, o questionário internacional foi divulgado pelo newsletter da Life Cycle Initiative de Novembro/Dezembro e contou com 106 participantes de 30 países, já a pesquisa nacional foi feita como os grupos de pesquisa em ACV nacionais e contou com 29 participantes.
Resumidamente, a tese teve o seu resultado pautado em três momentos: (a) a busca das condições de utilização / aplicação da ACV; (b) investigar a compreensão sobre a inter-relação entre a ACV e a ecoinovação e (c) apresentar e validar propostas para o efetivo uso da metodologia ACV no Brasil.
Utilização / aplicação da ACV:
ACV e ecoinovação
Quanto à existência de inter-relação entre a ACV e ecoinovação, a relação foi percebida por 90,7% dos entrevistados internacionais e 96,3% dos entrevistados brasileiros. As ecoinovações tem seus fatores determinantes centrados principalmente na tecnologia, na regulamentação e na demanda do mercado “verde”. Quanto a ACV pode-se verificar situação similar, onde a demanda de mercado, a demanda por informações gerenciais e a regulamentação, seriam os pilares envolvidos.
Assim como ocorre com a ecoinovação, a ACV atualmente tem espaço de ação e entendimento principalmente focado dentro das fronteiras das empresas (aqui se inclui a academia e institutos de pesquisa), mas através do uso de certificações, como a própria rotulagem ambiental, pode e deve passar a ser mais reconhecida e entendida, além destas fronteiras, condição necessária na transição para uma sociedade mais “verde”. O conjunto composto pela metodologia ACV e as ecoinovações decorrentes, pode ser responsável pela criação de produtos e/ou serviços que tenham de fato, ao longo do seu ciclo de vida, gerado impactos ambientais reduzidos, como exemplo pode-se citar as práticas de ecodesign.
Propostas para o efetivo uso da ACV no Brasil
A tese propôs duas formas de promover a aplicação efetiva da ACV nas empresas brasileiras, uma baseada no uso de rotulagem ambiental (tipo III), como forma de “puxar” o uso de ACV e o outro através do uso da pegada de carbono como um primeiro passo para a implementação da ACV (“empurrando” as empresas para o uso da ACV).
Em relação à rotulagem ambiental, entre os entrevistados internacionais, 81,7% disseram que a rotulagem ambiental poderia ser um facilitador para a divulgação e implementação da ACV, para os entrevistados brasileiros 76,9% tiveram essa percepção (no Brasil houve uma percepção negativa da aplicação efetiva da rotulagem ambiental em um curto prazo).
A pesquisa verificou que a rotulagem ambiental pode sim ter uma contribuição válida na disseminação e uso da metodologia, o que foi reforçado no âmbito internacional e nacional, mas que poderiam haver prejuízos quanto à qualidade e amplitude do estudo, além de que ao ser implementada para este intuito, a ACV não geraria necessariamente na empresa o entendimento dos benefícios do pensar orientado ao ciclo de vida. Em relação aos consumidores, há dúvidas se iria realmente promover o entendimento esperado quanto aos impactos gerados pelos produtos certificados. Além destes pontos negativos a rotulagem ambiental tem perspectivas negativas quanto ao tempo necessário para seu desenvolvimento e implementação no Brasil, desta forma, não iria cumprir o objetivo de colaborar com a disseminação da ACV em tempo.
Sobre o uso da pegada de carbono, 88,7% dos entrevistados internacionais acreditam que é um facilitador para a divulgação e implementação da ACV e para os entrevistados nacionais esse percentual foi de 81,5%. Embora 15,5% dos entrevistados internacionais tenham indicado preocupações em relação ao uso da pegada de carbono, mencionando que o seu uso poderia trazer mal-entendidos e simplificações ao uso da ACV, a utilização proposta pela tese foi a de ter a pegada de carbono como um primeiro passo. As empresas começariam a entender e trabalhar com a abordagem do ciclo de vida e a partir desta primeira experiência poderão evoluir para a metodologia reconhecidamente mais completa que é a ACV.
A pegada de carbono por ser parte da ACV, segue o mesmo padrão (quando baseada na ISO 14067) da abordagem do ciclo de vida quanto as fases e etapas a serem seguidas em sua aplicação, trazendo desta forma a prática da abordagem do ciclo de vida nas empresas que a executam. Outra questão quanto ao uso da pegada de carbono como primeiro passo para a implementação da ACV é que esta metodologia, em decorrência principalmente dos resultados e compromissos assumidos pelos países participantes da COP 21, tende a ter um maior uso e eventual cobrança, inclusive legal, nestes países.
O uso da pegada de carbono corrobora diretamente ainda com outros objetivos a serem alcançados pelo Brasil, referentes aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentáveis (ODS). Pode-se somar aqui também outro fator favorável ao uso da pegada de carbono que foi o lançamento do selo de pegada de carbono da ABNT.
A pegada de carbono é uma metodologia cujo entendimento e reconhecimento superou as fronteiras dos grupos de cientistas e pesquisadores do assunto. Ela é mais compreendida pela população de uma forma geral e de acordo com as considerações e conclusões decorrentes do presente estudo, o mesmo sugere que a pegada de carbono seja considerada como metodologia a ser utilizada como precursora de estudos de ACV nas empresas brasileiras, fator que tende a facilitar uma abrangente implementação da ACV no Brasil.
Acesso ao trabalho completo no repositório do IBICT: http://ridi.ibict.br/bitstream/123456789/891/1/Wladmir%20Motta_Doutorado_2016.pdf.
Wladmir Henriques Motta é doutor em Ciência da Informação pelo PPGCI – IBICT/UFRJ, mestre em Engenharia de Produção pela Universidade Federal Fluminense – UFF, especialista em Engenharia de Planejamento, pelo SENAI/PROMINP e graduado em Engenharia de Produção pela Universidade Federal Fluminense – UFF. Atualmente atua como docente nos cursos de Engenharia de Produção e de Administração da Universidade Veiga de Almeida e da Universidade Estácio de Sá.